sábado, agosto 27, 2005

O maravilhoso mundo do Trabalho

Ora bom, após um rompimento com os patrocinadores, acabaram-se os fundos e como tal a emissão do diário da queima foi suspenso indefinidamente. É possível que um dia destes seja retomado, por ventura não significa necessariamente a continuação desta edição mas de uma futura. As minhas desculpas ao caro leitor ( não tive notícia ainda que seja mais que um e desconfio que seja eu próprio para verificar a presença de erros ortográficos).

Coisas alegres, hilariantes, ridículas, tempo a mais, alcool a menos, enfim um rol de características me levam a relatar o atribulado quotidiano de Pedro Almeida. Certo dia vira-se o Cristo para mim e diz-me “Meu... e que tal arranjares uma vida.” Percebi então mais tarde que não fora o Cristo mas sim um qualquer rebarbado com quem eu dialogava via um desses antros manhosos do ciber-espaço. Decidi acatar a opinião e pus mãos à obra.

The beginning.

A vida de artolas não é bonita nem tão pouco agradável, uns dirão que a culpa é da vadiagem outros possivelmente culparão o macaco, eu prefiro crer que é da sorte ( ou da falta dela).

Após quase ganhar o jackpot do Euromilhões ( ainda acertei num número ), após quase transitar de ano lectivo ( faltou-me o de sempre bocadinho assim |___| ), tive que me refazer e andar com a vida para a frente, daí que optei por ingressar no profissional mundo do trabalho. Não, não entrei para a prostituição, não por falta de aptidões do foro físico por certo, mas porque julgo que o mercado está saturado e eu não iria acrescentar nada de novo ( se bem que não fico mal de saltos altos, top rosa e saia de cabedal preta..), em vez disso aderi ao fascinamente mundo do embalamento. Não, também não falo em street xuning racer (se é que alguém mesmo consegue relacionar a palavra embalamento com velocidade para além de mim). Co-packing, assim é o designo técnico da actividade por mim, com a cooperação dos colegas de trabalho, desenvolvida.

A empresa.

Era eu uma criança, digamos até aos meus 10 anos julgo, e sempre fora feliz e de boas relações com os individuos responsáveis pela manutenção da então Colep. Faziam-se festinhas para os meninos, que devidamente acompanhados pelos “papás” lá iam receber prendinhas por alturas do Natal. Longe andava eu de pensar que algum dia o destino me pregaria uma rasteira e se nesses saudosos anos eu, petíz, curioso, desembrulhava aquelas caixas freneticamente na ânsia de verificar o seu interior, eis que se não passados quase 10 anos, dou por mim na mesma Colep ( na verdade ColepCCL para ser mais preciso na medida em que resulta da fusão com a empresa rival de mercado ) a enfiar (literalmente) material para dentro de caixas qual geek informático em práticas onanistas após meia hora sem ver pornografia na rede.

O trabalho propriamente dito.

Na prática poder-se-ia descrever de forma muito simples, mas julgo que tudo o que por lá se passa merece ser descrito com um lirismo bem mais complexo e perfumado que um simples “ o trabalho é uma merda.”.

Confesso alguma inaptidão da minha parte para tudo o que seja referente ao acto de... bem vistas as coisas de fazer seja o que for que requeira esforço mínimo, no entanto, sendo eu aquele mente aberta, uma espécie de escuteiro sem farda e sem o mítico fardo homossexual inerente, parti para a aventura disposto a encontrar de tudo.

As primeiras visões recordo-me regurgitam sentimentos tenebrosos, suores frios e suados, algumas pinguinhas na cueca, mas nada que não fosse ultrapassável. Lá estavam eles. Novos soldados, libertadores de uma pátria, ou simples jovens à procura de algum para estorrar em drogas, sexo ou sapatos.

Endereçados ao “matadouro” qual rebanho desorientado, eis que somos recebidos pelo “pastor” ( por acaso até era uma pastora ) pronta a mostrar-nos o local de pastagem, isto não sem antes recebermos uma aula de história, não com o professor José Hermano Saraiva, mas antes com uma qualquer personagem de bata branca.

Percorrido todo o espaço foi tempo de por as mão à obra. Vini, vidi, vinci que é como quem diz, cheguei lá e atiraram-me para um canto “ Agora espera aí se fazes o favor.”

Enquanto membro do já designado rebanho, aceitei as ordens e aguardei.

Eis que chega a tão temida hora (!), e pergunto-me eu sobre o modo de explicar isto de forma a que me faça entender. Imaginemos uma prova de ciclismo, talvez a volta a Portugal. Ora em qualquer corrida há um lider, o camisola amarela, e assim não foge muito numa linha de montagem só muda a designação ( chefe de linha ) e não precisa de andar de amarelo... Depois há o pelotão que corresponde naturalmente às restantes marionetas.

Por muito que o não pareça, o dito trabalho ( eu prefiro pensar que é escravatura remunerada ) não é linear e assim como a volta a Portugal tem os seus momentos:

- Fugas, de quando em vez um dos subordinados em acto de rebeldia decide acelerar o ritmo de produção qual Candido Barbosa a fugir de Sousa Pernamanca, por conseguinte sendo este pertencedor ao já referido pelotão;

- Perseguidores, naturalmente referindo as fugas há sempre um ou outro perseguidor, que é como quem diz destemidos e bravos trabalhadores que anseiam por uma eventual promoção ao tentar fazer mais que aquilo que por vezes é possível;

- Carro vassoura, carro é um termo exagerado, são mesmo paletes. O indivíduo responsável carrega com o material do fundo da linha para a palete e posteriormente quando completa e com o auxílio do porta-correspondente para o local pré-destinado;

- Público, é isso mesmo, tratando-se de um espectáculo ( falo da volta a Portugal ) tem naturalmente a sua audiência. Ora nós também o temos. De quando em vez lá aparece um forasteiro armado em bombeiro voluntário ( sem a mangueira ) e daí podemos ter: os que “sim” e os que “até era mas estou aqui com uma cãimbra e não me dá muito jeito”, ou seja, os que estão para o paleio e aqueles que intervêem. No fundo falo daquelas pessoas que gentilmente regam os ciclistas ou dão palmadinhas nas costas e empurram o ciclista em tempos difíceis ( muitas vezes levando a que estes caiam ). É precisamente deste tipo de gente que falo;

- Contra-relógios, neste caso não será igual na medida em que não há intra-competição, mas antes um adversário comum a todos, o próprio relógio. Por dia verificam-se 4 “provas” deste tipo, antes dos intervalos, antes da hora do tacho, e perto da hora de dar de frosques;

- A subida ao monte da Graça, pode não o ser sempre mas o momento alto do dia verifica-se ali após o re-abastecimento das tropas, por volta das 21 horas. De resto pode não se combater a inclinação do terreno, mas não o é mais fácil combater o regresso após meia-hora em repouso quase clínico já para não falar das intempéries provocadas pelos industriais aparelhos de ar-condicionado.

- O pódio, de facto não existe, se bem que há por lá material com qualidade suficiente para ir entregar flores e garrafas de champanhe.

Dá para ver portanto tal a azáfama que por lá se orienta. Há coisas que não são bonitas de se ver é certo, o cheiro nem sempre é o mais agradável, os momentos mortos abundam e abusam, no entanto tem sempre aquelas pérolas que até nem tornam a coisa tão má como isso.

->Lá dizia o outro “antes a trabalhar que metido na droga” não digo que não, se bem que por vezes esta teoria é refutável...